sábado, 30 de abril de 2011

Será que precisamos de uma lei antibullying?

Para responder a esta questão, convido o leitor para uma pequena viagem ao início dos anos 80, na Noruega. Foi lá que o psicólogo Dan Olweus cunhou o termo bullying, referindo-se às humilhações violentadoras recorrentes ocorridas no espaço escolar. Tais atitudes já aconteciam há tempos, dentro e fora dos muros das escolas – e assim continua até os dias atuais. A diferença é que elas passaram a ter nome e a ser motivo de estudos. Após anos de estudos e baseado em milhares de entrevistas, Olweus propôs, não uma legislação antibullying, mas uma intervenção antibullying, envolvendo a sociedade de forma ampla e buscando alcançar dois objetivos básicos: desfazer mitos e ideias erradas sobre o bullying e promover apoio e proteção às vítimas.
Assim, retomo aqui a pergunta inicial: Precisamos de uma lei para isso? As leis já existem, afinal as agressões que ocorrem nas escolas também ocorrem fora dela: agressão física, desacato, assédio moral, assédio sexual, preconceito, roubo, entre outras. As leis existem e são importantes para preservar o senso de obrigatoriedade, as noções de igualdade e equidade, o valor da justiça. Sem dúvida, em tempos de analfabetismo moral, em que as pessoas não sabem mais quais valores regem suas vidas ou a sociedade, é fundamental que as leis nos guiem. Mas elas regem as situações de fora e são aplicáveis depois que o ato foi cometido. Nas situações como a de Realengo precisamos saber antecipar. Cada um de nós precisa parar e pensar: Será que temos que tratar as coisas depois que elas acontecem ou podemos encontrar forma de tratá-las antes que aconteçam? Qual exemplo de vida eu tenho sido para todas as crianças com as quais convivo? É importante evitar que o mal entre nas escolas, nas igrejas, nos ambientes sociais, mas será que conseguiremos pensar formas de evitar que o mal entre nas pessoas? Se a gente não parar agora para pensar nesses pontos, quando vamos pensar? A situação de Realengo provocou uma grande mancha na nossa alma nacional e causou muita dor. Precisamos refletir sobre as coisas que realmente são importantes: como fazer para mudar este cenário? Contribuo aqui com três atitudes. Obviamente existem outras mais, por isso, convido cada leitor a fazer a sua reflexão.
A primeira atitude que proponho é aprender a ver. Sabemos ver os nossos filhos? Sabemos ver nossos alunos, nossas crianças, nossos adolescentes? Ou apenas olhamos. Olhamos como quem passa os olhos vagos, desinteressados, desinformados – simplesmente observando.  A gente precisa aprender a ver – ver os comportamentos, ver os olhos, a entender o que estamos vendo. Sem olhos de ver, tudo passará despercebido – o bom e o ruim, tudo.
A segunda atitude é aprender a dialogar. Precisamos urgentemente aprender a conjugar simultaneamente três verbos: falar, ouvir e acordar. Falar de forma clara aquilo que pensamos, ouvir as opiniões e as reflexões das outras pessoas e entrar em acordos, transformando as diferenças em soluções conjuntas. Sem o diálogo há somente imposição, visão unilateral, desrespeito ao ponto de vista do outro.
A terceira atitude é proteger nossos filhos. É função dos adultos proteger as crianças e garantir que elas convivam em ambientes que estimulem relações sociais de qualidade. Isso implica, necessariamente, reforçar nas crianças o valor do respeito, da dignidade, da justiça, da generosidade, da vida, do outro. Isso precisa ser ensinado, resgatado, fortalecido no nosso dia a dia. Sem valores perdemos o norte, não sabemos para onde ir. Precisamos ajudar nossas crianças a construírem suas identidades baseadas em valores morais, caso contrário a lista de Realengo poderá continuar aumentando.
Está na hora de acordar. Que essa dor que todos sofremos enquanto brasileiros possa servir para que a gente reflita, busque soluções, se comprometa, perceba que a resposta está na atitude de cada um de nós. Nossa sociedade não vive sem leis – elas são necessárias e importantes. Porém, neste caso, não precisamos de mais leis – precisamos de mais humanidade.