Tento escrever um texto. Meu filho de 1 ano e meio está ao lado da mesa, na ponta dos pés, buscando de todas as forma possíveis me ajudar a digitar algumas palavras. Puxo o teclado para mais longe dele. Isso parece funcionar. Ele vai brincar e eu volto ao meu texto – por pouco tempo.
Ele vem com os seus livros de estórias e puxa a cadeira onde nos sentamos para ler. Vem para o meu lado e me puxa pela perna. “Eu não posso agora. Você sabe as estórias de cor e salteado. Pegue os livros e veja as figuras. Eu tenho que terminar este texto”. Ele sai meio decepcionado. Abre os livros e começa a apontar as figuras. Eu tento resgatar as idéias para o texto... Ah, não! Lá fora as vacas começam a mugir! E lá vem o pequeno, apontando a janela e gritando “buu, buu”. Tenta escalar as minhas pernas. Eu o coloco no colo e vamos ver os “buus” pastando. Acreditem: nós ficamos realmente vendo os “buus”. Eu, com o texto pela metade, não posso acreditar que estamos vendo “buus” fazerem nada. Meu filho percebe minha distração e, para me lembrar do óbvio, estica o bracinho e fala “buu, mamã, buu...”. “Sim, esses são os buus, mas eu tenho que terminar o meu texto”. Voltamos para a sala. Eu, para o texto; ele, para o chão.
Ele sai da sala e volta com o tênis na mão. Era só o que faltava! Querer passear justo agora! E passear quer dizer que vamos andar um pouco, ele vai querer que eu pegue a folha em forma de estrela para ele andar com ela na mão. Vamos ter que parar a cada queda da folha para pegá-la novamente e prosseguir caminho. Até que ele se cansará de andar, vai querer colo e, no caminho de volta para casa, vai acabar dormindo. “Não, é muito longo esse passeio e eu tenho um importante texto para escrever”.
Ele se senta no chão. Quando eu o vejo de novo, há duas lágrimas coladas no seu rosto. Nesse momento eu vejo as coisas como Deus as deve ver: em perspectiva. Vejo um menininho chorando porque eu não tenho tempo para ele. Imaginem alguém ser tão importante para outro ser humano!
Antevejo o dia em que não representará tanta coisa para uma pessoinha o fato de eu estar sentada ao seu lado, lendo uma estória que pouco significa para qualquer um de nós, mas compreendendo, de alguma forma, que o fato de estarmos sentados um junto do outro é que representa tudo.
Por um instante percebo que ele e eu temos bem poucos dias como este para compartilhar. O texto pode esperar! “Filho, vamos passear?”
Tenho que aproveitar agora mesmo – enquanto os “buus” ainda são maravilhosos, antes que as folhas deixem de ser troféus e sejam esquecidas no chão e enquanto o meu colo ainda é um lugar muito gostoso para se dormir.
Esse texto foi escrito em 1999. O tempo passou e eu posso afirmar que valeu a pena colocar em primeiro lugar as pessoas importantes na minha vida.